Dispositivo ajuda pessoas cegas a “verem” por meio da língua

O dispositivo de visão BrainPort é uma tecnologia de substituição sensorial bem diferente daquelas já apresentadas aqui no blog, visto que não trabalha com estímulos sonoros e sim com estímulos táteis que são reproduzidos na língua, por meio da estimulação elétrica.

O sistema foi criado pela Companhia norte americana Wicab e consiste em um conjunto de eletrodos do tamanho de um selo para a superfície da língua (a matriz da língua), uma unidade
de processamento, uma câmera de vídeo digital, e um controle manual para zoom e ajuste de contraste.

A informação visual é coletada da câmera ajustável que é acoplada à cabeça do usuário e enviado para a unidade de processamento BrainPort, que por sua vez, traduz a informação visual em um padrão de estimulação que é exibida na língua. A comunicação entre os componentes se dá via ondas de rádio.
A imagem tátil é criada através da conversão de pixels. Desse modo, pixels brancos geram forte estimulação, os pixels pretos não geram estimulação,
e tons de cinza geram níveis intermediários de estimulação, com a capacidade de ajustar contraste, quando apropriado.
Os usuários frequentemente relatam que a sensação produzida pelas imagens que são formadas sobre a língua, é a de bolhas de refrigerante.

Os cientistas estudam a apresentação eletrotátil de informação visual desde 1900 pelo menos. Essas pesquisas normalmente usavam uma câmera para estabelecer os níveis de estimulações elétricas para uma matriz de eletrodos. A pessoa tocando a matriz podia perceber o formato e a orientação espacial do objeto em que a câmera estava focada. O BrainPort desenvolve essa tecnologia e é considerado mais moderno, prático e preciso que os sistemas anteriores. Por uma razão, o BrainPort usa a língua em vez das pontas dos dedos, abdômen, costas ou audição (usados por outros sistemas).
A língua é mais sensível que outras áreas da pele pois as fibras nervosas estão mais próximas da superfície, são mais numerosas e não há stratum corneum (uma camada exterior de célula de pele morta) para agir como isolador. É necessária menos voltagem para estimular as fibras nervosas na língua, 5 a 15 volts comparados com 40 a 500 volts para áreas como as pontas dos dedos e abdômen. Além disso, a saliva contém eletrólitos, íons livres que agem como condutores elétricos, para ajudar a manter o fluxo de corrente entre o eletrodo e o tecido da pele. E a área do córtex cerebral que interpreta dados táteis da língua é maior que as áreas que interpretam para outras partes do corpo, então ela é uma escolha natural para transmitir dados baseados no tato para o cérebro, possibilitando, inclusive, sua utilização por pessoas com surdocegueira.

Com o sistema atual, um protótico contendo 600 eletrodos), participantes do estudo foram capazes de reconhecer objetos de alto contraste e especificar a sua localização, ainda quando em movimento.
Também foram capazes de reconhecer tamanho, forma, distância e profundidade de diferentes objetos e espaços.

Acerca dos resultados obtidos nessa fase de testes, Dr. William Seiple, membro da equipe de pesquisa, teceu as seguintes considerações:

“Os deficientes visuais podem até sentir os pulsos na língua, mas também percebem as imagens geradas desses pulsos pelo cérebro. Eles notaram os objetos na sua frente, fora do alcance de suas mãos. Podiam perceber e identificar as letras do alfabeto. Em um caso, quando o alpinista cego Erik Weihenmayer testou o aparelho, foi capaz de localizar a esposa em uma floresta.
Uma das questões mais comuns nesse ponto é: Eles estão vendo de verdade? Isso tudo depende de como você define visão. Se ver significa você poder identificar a letra “T” em algum ambiente externo, sentir quando esse “T” é aumentado, diminuído, muda a sua forma ou se distancia de você, então eles estão realmente vendo.”

Um estudo que realizou exames cerebrais em cegos congênitos enquanto usavam o aparelho de visão BrainPort verificou que, depois de várias sessões com o BrainPort, o centro da visão de seus cérebros se iluminava quando informações visuais iam para o Sistema Nervoso Central por meio da língua.

“Se “ver” significa que há atividade no centro da visão do córtex cerebral, então os deficientes visuais estão realmente vendo.” Concluiu Dr. Seiple.

O experimento em curso com o dispositivo de visão BrainPort demonstra o grande potencial de aumento de visão tátil e a equipe desenvolvedora acredita que estes resultados justificam um maior investimento em pesquisa.
Atualmente estão trabalhando em melhorias para o hardware, especialmente da placa de eletrodos que vai sobre a língua, software e usabilidade, e na miniaturização dos dispositivos em geral.
Apesar de não haver previsão quanto a data, a companhia estima um lançamento comercial, com preço de venda estimado em US$10 mil por unidade.

Clique aqui para assistir uma demonstração do BrainPort

Autor: Léo Filho

O internacionalista e advogado Léo Filho tem se dedicado a causa das pessoas com deficiência, atuando na divulgação e defesa de seus direitos. Enxerga na tecnologia uma grande aliada para a construção de um mundo mais acessível, de uma sociedade em sintonia com o ideal da inclusão.

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